#06: ESCAPISMO ANALÓGICO
A volta da Tekpix e do nokia "tijolo”, o hype da cerâmica e do tricô e vontade de se desconectar de tudo estão interligados no pack escapista analógico do mundo contemporâneo.
Trop Drops é um conteúdo mensal para nossos assinantes acompanharem sinais de comportamentos emergentes a partir do Radar de Tropicalização - metodologia exclusiva de Trop para mapear e localizar tendências, que você pode conhecer em detalhes aqui :)
Na edição de hoje:
💡A volta da Tekpix e do nokia "tijolo”, o hype da cerâmica e do tricô e vontade de se desconectar de tudo estão interligados no pack escapista analógico do mundo contemporâneo.
Lembra daquelas manhãs de escola, quando a perspectiva de ter aulas de arte ou educação física às vezes era o suficiente para convencer seus pais de que você não perderia nada crucial se faltasse às aulas? Pois é, no mundo ocidental, estamos acostumados a valorizar atividades intelectuais em uma posição hierárquica superior, muitas vezes em detrimento de habilidades práticas e manuais. Some a isso uma rotina em que muitas pessoas passam horas a fio atrás de telas, consumindo notícias, comunicando-se, elaborando pensamentos e tomando decisões — tudo simultaneamente e, se possível, adiando demandas e planejando tarefas.
Este modo de vida tem gerado um cenário ideal para duas dificuldades essenciais: a primeira é viver o presente, experienciando aquele estado de foco e desafio que chega a ser prazeroso. A segunda dificuldade é a desconexão com o próprio corpo, pois nos movimentamos cada vez menos. Como resposta a essas questões, surge um movimento global que nos convida a resgatar doses de escapismo analógico sempre que possível. Estamos nos voltando para atividades manuais não apenas como uma forma de lazer, mas como uma necessidade para manter nosso bem-estar mental e físico, num mundo onde o futuro, ao contrário do que se pensava, está longe de ser dominado por uma realidade ciborgue.
Em um mundo onde buscamos escapismos analógicos, não se trata sé e relaxar mas do prazer em conseguir focar. Estamos buscando maneira de resgatar a sensação de “flow”, que é algo cada mais raro na vida adulta contemporânea:
QUANDO FOI A ÚLTIMA VEZ QUE VOCÊ ENTROU EM FLOW?
O estado de "flow" é um conceito psicológico que descreve uma experiência de total imersão e envolvimento em uma atividade, onde a pessoa se sente energizada e focada. Esse estado é caracterizado por um alto nível de prazer e produtividade. O termo foi cunhado pelo psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi na década de 1970, que observou esse fenômeno inicialmente em artistas que se perdiam em seu trabalho.
Não é por acaso que existe um fenômeno global de pessoas recorrendo à escrita como terapia ou voltando a usar dispositivos analógicos.
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O Pinterest publica anualmente um relatório que indica buscas em alta. No último ano, as atividades manuais terapêuticas ganharam destaque.
O que isso tudo nos diz?
Com rotinas cada vez mais dominadas por ferramentas e atividades online, a facilidade tecnológica transformou-se em uma dependência contemporânea, tornando-nos reféns do mundo digital. Embora a internet ofereça acesso ilimitado à informação e à experimentação, o excesso de exposição tem fadigado nossa criatividade. A busca por recursos que promovam a desconexão digital torna-se essencial para manter nossa saúde mental e criatividade aflorada.
Abaixo, vamos olhar etapa por etapa:
IMAGINAÇÃO: Nível 3 - Pulsante
Imaginação é a etapa onde entendemos a força da tendência no imaginário coletivo, por meio da análise das 7 variáveis que ajudam a criar desejo e relevância para um tema.
Quando se trata de imaginário global temos diversas manifestações do escapismo analógico pulsando na cena cultural, midiática e de consumo. Desde os hobbies resgatados durante a quarentena como fazer pães ou montar quebra-cabeças, agora vemos muitos deles ganham uma força coletiva e demandas de consumo.
a.6Grupos e Movimentos:
Ravelry, uma rede social com mais de 4 milhões de usuários voltada para artes de fibra, destaca-se como um exemplo vibrante de como comunidades globais estão se unindo em torno de hobbies manuais.
a.7 Marcas e Plataformas Globais: Iniciativas de marcas como Lego, que em sua campanha “Find Your Flow”, destaca o uso de legos para como brincadeira terapêutica para desestressar adultos. A campanha inclui uma narrativa cinematográfica e parcerias com artistas como Lofi Girl, realçando a importância do análogo mesmo em um produto originalmente digital.
IDENTIFICAÇÃO: 3/10 nível emergente
Identificação é a etapa onde analisamos e medimos o fit da tendência com o contexto local, que nessa análise é considerando o Brasil. Para isso, analisamos 7 variáveis que medem o entendimento e a experimentação. Aqui é onde começamos a compreender melhor a TROPICALIZAÇÃO, ou seja, a modulação da tendência conforme o contexto. Se em imaginação observamos códigos globais, aqui aterrissamos para o cenário local.
Quando se trata da tradução da tendência em contexto local, vemos que o Brasil manifesta sinais pulsantes em consonância com o ritmo global da tendência.
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Adotar recursos que ajudem a evitar o vício das telas pode auxiliar no foco e criar espaço na rotina para atividades terapêuticas. Por isso, os telefones de flip e câmeras digitais antigas são uma febre não apenas entre os jovens gringos, viu? Por aqui, itens eletrônicos que são característicos dos anos 2000, além de proporcionarem uma experiência nostálgica, permitem que os jovens da nova geração eliminem ruídos e superestímulos de suas atividades. Em estudos qualitativos ouvimos ainda sobre o relato de garimpá-los em brechós e sites de usados a preços bem acessíveis.
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Tudo isso cria também novas oportunidades de negócios locais.
No Brasil, o mercado de jogos analógicos tem crescido muito. De acordo com a Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), no ano pandêmico de 2021, mais de R$ 7,8 bilhões foram movimentados, 4% a mais que no ano anterior, quando a receita foi de R$ 7,5 bilhões. Hoje, esse hábito segue aquecido mas não fica mais restrito aos ambientes privados da casa.
APROPRIAÇÃO: Nível 2 - emergente
A etapa de apropriação mede variáveis que ajudam a analisar a familiaridade e proximidade da tendência junto ao contexto local, fatores essenciais para possibilitar a reinterpretação com códigos locais.
Ser nível 2 nesta etapa significa que ainda há espaço de crescimento quando pensamos no público mainstream de forma geral.
c.1 Indústria Cultural e Entretenimento Local: Pipocam os conteúdos de canais locais sejam de grande cobertura ou mais independentes com uma série de conteúdos que estimulam o trabalho manual ou a cultura da customização.
SLOW é um documentário realizado pela produtora Pouca Nuvem, que questiona nossa relação com o tempo e até onde o ambiente em que estamos pode influenciar nisso. É possível viver uma vida calma mesmo estando numa cidade acelerada?
Variável c.4 Conversa Popular: No TikTok, conteúdos de customização e do-it-yourself são prevalentes, com foco em atividades que encorajam a desconexão e o trabalho manual. Isso indica que a tendência está começando a se manifestar mais claramente em conversas e práticas cotidianas.
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Vale adicionar nessa equação a arte terapia como ferramenta de sociabilidade. Cresce o número de trends que pessoas seguem atividades coletivas orientadas por desafios que envolvem atividades manuais geram relaxamento, concentração e fomentam a criatividade de maneira que ajude na conexão entre pessoas.
TÁ, MAS E AÍ? O QUE A GENTE FAZ COM ISSO?
Sai das redes e vive um eterno detox digital e analógico? Sabemos que não seria viável, uma vez que já nos demos conta de que a vida atrás das telas é mais que escolha é também necessidade de muitos. O interessante deste movimento é justamente entender a importância de escapismos que se fazem cada vez mais intencionais e planejados. Reconhecer e incorporar momentos de desconexão digital em nossas vidas pode ser tão simples quanto escolher construir algo com as próprias mãos, seja montando um kit de Lego ou dedicando uma tarde para a jardinagem. As marcas e plataformas que apoiam essas atividades não só atendem a uma necessidade crescente de bem-estar mental, mas também se posicionam como aliadas em um mundo onde o equilíbrio entre o digital e o manual se torna essencial para uma vida saudável e criativa.
Por que a trend ESCAPISMO ANALÓGICO é estratégica para as marcas no Brasil?
Estamos diante de um consumidor que se dá conta das telas como um espaço de ruídos e dependência emocional, e que demanda ajuda para encontrar escapes que permitam a reconexão com corpo e mente e a desconexão com passado e futuro justamente para se viver o agora.
Como colocar a tendência na prática?
Abusar do Sensorial: Em um contexto de alta conectividade, oferecer experiências que engajem os sentidos pode ser uma poderosa forma de diferenciação. Trabalhar os atributos de marca que fortalecem a experiência física com o produto não só enriquece a interação do consumidor, mas também cria uma memória marcante que pode reforçar a fidelidade à marca.
Marcas que pensam o momento de uso do produto como uma maneira de se conectar com o corpo e o presente dialogam com este movimento.
Liberdade para Trabalhar Diferentes Texturas e Experiências de Produto: Ao criar produtos que envolvem diferentes texturas e que permitem múltiplas formas de interação, as marcas podem transformar o uso do produto em um evento em si. Isso não só aumenta o valor percebido, como também incentiva o consumidor a engajar-se mais profundamente com o produto, explorando todas as suas facetas.
Criar Canais de Desconexão via Interação com a Marca: Fortalecendo os atributos físicos e sensoriais dos produtos, as marcas podem servir como pontes para a desconexão digital. Ao oferecer alternativas que incentivam o afastamento das telas, mesmo que temporariamente, as marcas não apenas promovem o bem-estar dos consumidores, mas também se posicionam como aliadas em sua busca por equilíbrio e saúde mental.
Pra fechar, uma reflexão…
Quando pensamos em tendências, é fácil imaginar coisas super futuristas, quase tiradas de um filme de ficção científica. Mas entender tendências é também saber olhar para trás e ver como velhos hábitos ganham novos significados. A desconexão digital, por exemplo, não é sobre largar a tecnologia, mas sobre redescobrir e ressignificar práticas do passado como o artesanato ou a jardinagem, dando a elas um lugar no nosso dia a dia tecnológico.
Enquanto nos preparamos para um futuro cheio de IA e realidades virtuais, esses hábitos "antigos" são mais que um respiro: são essenciais. Eles nos mantêm conectados com o que é tangível e verdadeiramente humano, servindo como um contrapeso necessário ao nosso mergulho no digital.
Então, enquanto planejamos o futuro, que não esqueçamos de olhar ao redor e valorizar as lições do passado. Afinal, as melhores soluções para amanhã podem estar escondidas nas tradições de ontem.
#AJUDARS
Antes de partir não custa reforçar que:
Em momentos como este, nossa solidariedade é fundamental. Estamos profundamente sensibilizados com a tragédia climática e social que está afetando tantas vidas no Rio Grande do Sul. Se você está em posição de ajudar, encorajamos que faça doações e se atente às necessidades urgentes da população afetada. Cada gesto de apoio faz uma diferença significativa na recuperação e reconstrução das cidades impactadas.
TROP - sinais de um futuro tropical, latino e circular
Não me lembro de ter assinado essa newsletter ou mesmo de tê-la recebido outras vezes.
Adorei o texto.
Com certeza lerei os outros.