#07: CRIATIVIDADE CO-CRIADA
O que Drake, Elis Regina na Kombi e Bruno Latour nos indicam sobre o futuro da criatividade
Trop Drops é um conteúdo mensal para nossos assinantes acompanharem sinais de comportamentos emergentes a partir do Radar de Tropicalização - metodologia exclusiva de Trop para mapear e localizar tendências, que você pode conhecer em detalhes aqui :)
Na edição de hoje:
💡O que Drake, Elis Regina na Kombi e Bruno Latour nos indicam sobre o futuro da criatividade
Em 2017, a youtuber Taryn Southern gerou polêmica na cena musical quando, sem conhecimento sobre composição musical, lançou um álbum inteiro usando inteligência artificial. Hoje, sua bio orgulhosamente ostenta o título “1st AI pop albumˮ.
Chegamos em 2024 e a música Heart On My Sleeve, hit que reúne Drake e The Weeknd cantando sobre Selena Gomez, foi executada mais de 253mil vezes no Spotify e foi utilizada mais de 8,5 milhões no Tiktok. O detalhe é que esse feat nunca existiu e o hit foi criado por um fã usando inteligência artificial. Gerou discussão, mas a vida seguiu.
Do disco polêmico de Taryn em 2017 para a normalização do fake hit, vemos a inteligência artificial adentrando cada vez mais os espaços criativos, instigando mais gente a testar essa nova forma de criar. Tanto que começam a pipocar cursos para critivos.
É o caso da Samaritual, uma espécie de escola que mescla arte, pesquisa e estudos de futuro, com sede em Nova York, que lançou uma nova certificação chamada Imaginaology, com o intuito de ensinar as pessoas “a arte de imaginar usando I.A. generativa”. O interessante aqui é que não se trata de um curso sobre a ferramenta e sim sobre a capacidade de apreender a criar com inteligência artificial.
Diante de tudo isso, muita gente tem se perguntado: quais são as novas fronteiras da autoria e da autenticidade? Pode a máquina ser criativa? Uma obra feita com ajuda de inteligência artificial pode ser considerada arte? Como fica nossa capacidade de criar?
O que isso tudo nos diz?
Mais que respostas, essas perguntas todas nos mostraram que estamos diante de um novo mindset, que vai além de autoria e fala sobre usar a inteligência artificial não apenas como ferramenta, mas como dupla. Estamos diante de um novo debate sobre criatividade e sobre as maneiras de exercer o trabalho criativo a partir de uma interação ferramental entre humano e máquina que, sim, deixa nebulosa as fronteiras da autoria, da inspiração e da originalidade. Chamamos esse comportamento de Criatividade Co-Criada.
Para entender melhor sobre a tendência vamos decupar os resultados mapeados no Radar:
IMAGINAÇÃO: Nível 2 - Emergente
Imaginação é a etapa onde entendemos a força da tendência no imaginário coletivo. Quanto maior o índice de imaginação, mais interesse e atenção ela desperta e - com isso - mais força comercial ela tem.
“A mão de uma jovem com esmalte segurando um cosmopolitan.”
“Uma mulher elegante em close, dirigida por Wes Anderson.”
“Uma mulher usando um brinco que é um portal para outro universo.”
Esses foram alguns dos prompts usados pela equipe da Cosmopolitan, em junho de 2022, para gerar a primeira capa de revista gerada por [ou com?] inteligência artificial.
De lá pra cá, a criatividade powered by I.A. tem sido assunto recorrente nos principais veículos do mundo. Falando bem ou falando mal, o fato é que o tema tem sido debatido de maneira crescente, se tornando um indicativo para o Radar.
E é isso que medimos na variável a.3 Mídia e Imprensa, que mapeou mais de 19.000 artigos levantando a pauta da criatividade a partir da I.A.. Considerando o recorte temporal de abril de 2022 a abril de 2024 o aumento ultrapassou 1.900%.
Outra variável importante para medir o desejo por experimentar e, talvez aderir, ao comportamento de Criatividade Co-Criada é a variável a.7 marcas e plataformas globais. Em nível emergente, indica que há um crescimento expressivo de marcas com relevância e alcance global para impactar a sociedade, corroborando com a ideia de criar com essa “nova dupla”.
Um exemplo é o Canva, ferramenta com mais de 125 milhões de usuários que vem impulsionando suas ferramentas de IA, e enaltecendo muito os benefícios disso em sua comunicação. Aqui, você encontra o último relatório da plataforma, que traz uma pesquisa - com um tom bem positivo - sobre profissionais de marketing e I.A..
Mapear o número de plataformas globais é um indicativo importante em termos de mercado e acesso. Quanto mais grandes marcas aparecem envolvidas no tema, mais chance das pessoas testarem e adotarem. Por isso, o aquecimento dessa variável é um indicativo importante de crescimento da tendência no futuro próximo.
Vamos agora ver os sinais mapeados no contexto Brasil:
IDENTIFICAÇÃO: Nível 2 - Emergente
Identificação é a etapa onde analisamos e medimos o fit da tendência com o contexto local - que nessa análise é considerando Brasil. Quanto maior o índice de identificação, mais aderente ela está daquele mercado e, por isso, mais curto o timing para ativá-la.
No Brasil, estamos observando um crescente interesse pela experimentação da inteligência artificial no contexto dos recursos de criatividade. Esse despertar para as diferentes ferramentas e possibilidade em diferentes áreas se volta para entender como essa tecnologia, anteriormente vista apenas em contextos de ficção científica, pode ser incorporada às rotinas.
Nesse processo de descoberta, os criadores de conteúdo assumem um papel significativo, servindo como tradutores culturais que não apenas divulgam dicas e hacks, mas também desenvolvendo cursos e e-books, incentivando que mais pessoas passem a testar a ideia de duplar criativamente com inteligências artificiais - do texto do post à redação da escola.
Por isso, uma variável importante para medir o aquecimento da tendência em nível local é a b.1 Tradutores Locais, na qual observamos sinais de futuro junto a pessoas referências em suas áreas que apresentam e chancelam a ideia de usar inteligência artificial em seus processos criativos. São inúmeros especialistas de diferentes áreas que vêm divulgando dicas, métodos, cursos em diversas áreas.
Seguindo o radar, vamos para a análise de Apropriação, avaliando a força dos códigos locais que estão ressignificando a tendência.
APROPRIAÇÃO: Nível 1 - Embrionário
A etapa de apropriação mede variáveis que ajudam a analisar a familiaridade e proximidade da tendência junto ao contexto local, fatores essenciais para possibilitar a reinterpretação com códigos locais.
Se por um lado ainda estamos entendendo como a inteligência artificial vai mudar nossas novelas, livros e músicas, de outro lado já estamos à mil pensando e debatendo essas possibilidades. E é nas redes sociais que isso se materializa, através de fanfics, paródias e memes que vão possibilitando que os brasileiros passem a explorar a sua criatividade nata a partir de uma nova tecnologia.
A variável c.4 Conversa popular mensura e avalia as menções e a presença da tendência no diálogo popular geral, através de comentários, hashtags, conteúdos. E por aqui, notamos duas vertentes pelas quais podemos observar os brasileiros testando a Criatividade Co-Criada:
1 - as histórias e novelas usando I.A.: basta uma olhadinha no TikTok para ver que tem muita gente testando seus talentos a partir de novos apps e ferramentas, resultando em centenas de histórias fofinhas para criança à fantasias surreais para jogadores de RPG.
2 - memes infinitos: não bastasse nosso talento em criar memes, agora estamos ficando proficientes em ferramentas usando inteligência artificial para fazer deboche. Se você é habituê do Tiktok, já deve ter sido impactado por memes que transformam mensagens de WhatsApp em músicas sertanejas - criados por ferramentas como a I.A. Suno [que por sinal acabou de receber um aporte de milhões em investimento.]
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TROP SCORE: Nível 2 - Emergente
Trop Score é o resultado geral do Radar de Tropicalização, considerando a aferição de todas as variáveis e etapas a nível qualitativo e quantitativo. É a partir desse score que trazemos o diagnóstico e as recomendações acionáveis para cada tendência.
A tendência Criatividade Co-Criada se encontra no nível 2 do Trop Score, o que indica o nível emergente. Impulsionada principalmente por grandes plataformas globais de tecnologia e estimulada em diferentes comunidades por tradutores locais, é uma tendência que já tem expressividade de adoção em diferentes cenários e contextos, mas que ainda tem muito pela frente até se consolidar.
O Score emergente é um momento bastante propício para marcas colocarem projetos na rua, aproveitando a curiosidade inicial em torno do tema e se consolidando como marca atualizada.
Por que a trend Criatividade Co-criada é estratégica para as marcas no Brasil?
A Criatividade Co-criada fala sobre tecnologia, mas fala principalmente sobre a capacidade de imaginar e materializar ideias, produtos, situações. Estamos aprendendo a mexer no MidJourney, mas estamos aprendendo, acima de tudo, a dar forma para cenários e situações fantásticas. E em um contexto em que a vida real tem sido difícil, sofrida e complicada demais, o lúdico e o imaginado ganham um valor ainda maior.
Não à toa estamos vendo a busca por alienação explodir. É o caso da trend #delulu no Tiktok, que tem mais de 3,1bi visualizações e um aumento de 33x na taxa de crescimento das visualizações de um ano para o outro. Enraizada na cultura de fandom, #delulu é uma mentalidade e um formato de narrativa intensificada pela comunidade TikTok, que mistura fantasia e manifestação. Ela não tem nada a ver com inteligência artificial, mas tem tudo a ver com a crescente da imaginação.
Por isso, a oportunidade aqui é menos sobre usar ou não inteligência artificial na criação do seu filme publicitário e sim entender que estamos vendo o público aderir e se entusiasmar com a possibilidade de criar universos imaginários, como um pedido de escapismo e reinvenção do cotidiano.
Como colocar a tendência na prática?
Por aqui, entendemos a Criatividade Co-Criada como um grande convite às marcas de possibilitarem essas pílulas de imaginação para seu público - seja através de ferramentas ou mesmo através de comunicação.
COMUNICAÇÃO:
Um dos principais recursos da publicidade é justamente o poder de ajudar a imaginar. E é aqui que vemos como o combo criatividade humana + poder combinatório e agilidade da máquina podem potencializar uma nova era na comunicação, indo além daquilo que era possível criar.
Um exemplo marcante [e polêmico] foi Volkswagen trazendo Elis Regina de volta para cantar com Maria Rita, sua filha. Houve quem chorou, houve quem protestou. Mas que causou, causou. Só no Youtube, foram 33 milhões de views:
E um pouco mais recente e mais singelo, mas de uma relevância gigante, é a campanha da Vivo, que mostra como a inteligência artificial pode ser usada para traduzir mundos internos de crianças com espectro autista para outras pessoas:
Dois exemplos bem diferentes que mostram como, sim, já estamos vivendo um cenário onde nossa criatividade é potencializada/expandida com novos recursos.
Para quem é dos times de performance e quer saber como isso impacta no $$, um case a ser observado é a Firework, empresa de live commerce que conta com um sistema alimentado por I.A., no qual mesmo após o término do evento ao vivo os compradores podem fazer perguntas sobre os produtos ou serviços apresentados e receber respostas personalizadas.
https://firework.com/solutions/live-events/
PRODUTO:
Para além de ferramenta interna, auxiliando em testes de conceito e concepção de produto, a Criatividade Co-Criada permite que o consumidor adquira um papel criativo. Ele busca explorar seus desejos e gostos por meio de novos produtos e serviços inovadores, muitas vezes imaginando aquilo que nem mesmo a marca consegue oferecer.
Para as marcas, pode ser uma oportunidade rica de receber insumos sobre o que de fato está no imaginário do seu público, cabendo a elas serem as viabilizadoras desses desejos. Uma marca de bebida, por exemplo, tem muito a descobrir com as criações que as pessoas pedem via BarGPT:
MODELO DE NEGÓCIO:
Para além de modelos de personalização, ideação e tantos outros modelos que a co-criação com a máquina permite, pensar o modelo de negócio com o filtro dessa tendência é pensar sobre novas possibilidades de usar a tecnologia para impulsionar seus colaboradores e talentos a se concentrarem mais em inovação e trabalhos criativos, buscando ampliar a capacidade de inspiração e originalidade humana.
Pra fechar, a gente deixa uma reflexão…
Vimos muitos sinais de como a Criatividade Co-Criada está se manifestando em diversas áreas, como música, artes, indústria criativa e no cotidiano. Isso gera um grande debate sobre os limites da arte e da co-autoria. Mas sabemos que há um lado muito mais complexo e preocupante sobre como a essa criatividade pode escalar : de substituição de profissionais criativos à fake news e pornografia infantil.
Como afirmou o filósofo Bruno Latour, em seu ensaio Love your monsters, “o crime de Dr. Frankenstein não foi ter inventado uma criatura a partir da combinação de arrogância e alta tecnologia, mas o fato de que ele a abandonou à própria sorte”.
Aqui enxergamos um cenário semelhante. Nossa criatura, a I.A., possibilita um mundo de novas experiências e iniciativas criativas. Mas precisa de cuidado e responsabilidade. A criatividade é infinita e a ferramenta exponencial. Cabe a nós moldarmos esse futuro de forma que essa co-criação possibilite cenários futuros positivos e regenerativos.
Co-criem com responsabilidade 🙂
Até a próxima.
#AJUDARS
Antes de partir não custa reforçar que:
Em momentos como este, nossa solidariedade é fundamental. Estamos profundamente sensibilizados com a tragédia climática e social que está afetando tantas vidas no Rio Grande do Sul. Se você está em posição de ajudar, encorajamos que faça doações e se atente às necessidades urgentes da população afetada. Cada gesto de apoio faz uma diferença significativa na recuperação e reconstrução das cidades impactadas.
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