#05:Trop Drops | Empatia Programada
O que o cachorro do Alok e as brigas com a Alexa nos contam sobre a sociedade do futuro.
Trop Drops é um conteúdo mensal para nossos assinantes acompanharem sinais de comportamentos emergentes a partir do Radar de Tropicalização - metodologia exclusiva de Trop para mapear e localizar tendências, que você pode conhecer em detalhes aqui :)
Na edição de hoje:
EMPATIA PROGRAMADA
A Empatia Programada é uma das 5 tendências do Modo PROMPT, novo estudo de Trop que investiga como a Inteligência Artificial está impactando a forma como vivemos e nos relacionamos. O estudo está disponível aqui.
💡 O que o cachorro do Alok e as brigas com a Alexa nos contam sobre a sociedade do futuro.
Em fevereiro, o DJ Alok anunciou para o mundo o mais novo membro da sua família: o Aulok, o cão-robô da startup chinesa Unitree Robotics. O modelo escolhido é equipado com inteligência artificial generativa para entender comandos de voz e tomar decisões autônomas. Além da I.A., o robô conta com um sistema de sensores de movimento nas “patas”, câmera frontal de ampla captação, lanterna de alta potência, conexão via Wi-Fi, entre outras funções para acompanhar seu “dono”.
Bizarro ou não - quem sou eu para julgar - as buscas por "cachorro-robô” no Google no Brasil tiveram um pico de crescimento de +150%. Os millennials que passaram a infância assistindo Os Jetsons sentiram que chegou a hora deles!
Do retrato da família direto para o divã, vem aí o Psychologist, um bot da Character.AI, uma plataforma onde qualquer pessoa pode criar chatbots baseados em pessoas fictícias ou reais que nos últimos 3 meses teve mais de 200 milhões de visitas.
O bot em questão é descrito como “alguém que ajuda com as dificuldades da vida” faz o papel de terapeuta e já recebeu mais de 78 milhões de mensagens no último ano.
Os casos do Aulok e do Psychologist nos fizeram perceber que, mais do que nunca, estamos observando o estreitamento na relação homem-máquina. E para além de um comportamento pragmático, de um comportamento servil, passamos a de fato nos afeiçoar a esses novos personagens.
O que isso tudo nos diz?
Há muita discussão sobre aprender a usar as ferramentas de inteligência artificial. No entanto, estamos apenas começando a conversar sobre como nos relacionar com ela. Afinal, se começamos a ver a inteligência artificial como uma companhia ou até mesmo uma conselheira, estamos assumindo que a conexão com ela é tão íntima quanto com outros seres. Isso nos leva a um novo comportamento emergente que chamamos de EMPATIA PROGRAMADA.
⚠️ A tendência, identificada pelo Radar de Tropicalização, sugere que em um contexto onde não conseguiremos mais distinguir se uma conversa é mediada por um humano ou uma máquina, surgirá uma nova categoria de relações. Com isso, novas formas de conexão, criação de laços e expressão de emoções aparecem.
Para entender melhor sobre a tendência Empatia Programada, vamos decupar os resultados mapeados no Radar:
Máquinas senscientes se relacionando e se afeiçoando à humanidade é algo que a indústria cultural vem explorando há algum tempo. De R2D2 em Star Wars à Samantha em Her, não faltam exemplos de relações afetivas entre homem-máquina no cinema e literatura, fortalecendo esse imaginário de que, na falta de afeto humano, máquinas podem ocupar esse lugar. E essa narrativa só aumenta, como observado na variável
a.1 Indústria Cultural e Entretenimento Global.
A partir dos dados do Radar, verificamos que da década de 2000-2010 para a década 2010-2020 houve um crescimento de 324% de obras que retratam a relação homem-máquina. De 2018 até 2023, por exemplo, foram mais de 200 filmes*.
A diferença do que vivemos hoje para anos atrás é que, se R2D2 e Samantha pareciam ser coisa de um futuro longínquo, agora estamos de fato trazendo esses personagens para nossa vida. Alexa, Siri, ChatGPT e tantas outras “entidades” passam a ser parte da nossa rotina. A variável a.3 Mídia e Imprensa, em nível pulsante [o mais forte dos sinais], nos mostra isso. São milhares de artigos e reportagens globalmente abordando essa nova relação homem-máquina.
Tem aquelas que nos ajudam a entender esse fenômeno:
Amor por chatbot: como é se apaixonar pela sua IA - Experience Magazine (expmag.com)
E aquelas que nos fazem questionar se isso vai dar bom:
O fato é que a Empatia Programada apresenta um nível Emergente na Etapa de Imaginação, sinalizando que a curiosidade e o desejo em relação à esse comportamento está tomando força.
Vamos agora dar um zoom in pra entender isso pelas bandas daqui.
Que os brasileiros adoram uma inovação, não é novidade. Mas quando o assunto é tornar esse relacionamento com as máquinas algo real no dia a dia, estamos aprendendo como de fato isso vai funcionar. Isso significa que as variáveis de identificação são mais baixas por aqui. Ou seja, não temos ainda uma grande quantidade de especialistas falando sobre o tema, não temos tantas comunidades focadas em relacionamento homem-máquina, não temos tantos cursos/palestras. Ainda.
Mas o interesse existe. A variável de b.2 Mídia e Imprensa Local está no nível emergente, indicando um crescimento do tema. Conforme mapeamos por aqui, foram publicados mais de 45 mil artigos em portais e conteúdos e notícias sobre a relação homem-máquina e seus desdobramentos - um aumento de 273% nos últimos três anos. Aqui, uma amostra desses artigos:
A variável de mídia e imprensa local é um indicador importante, pois contribuiu diretamente para o entendimento e identificação do tema. À medida que a mídia destaca esse novo cenário de relacionamentos, mais pessoas adquirem conhecimento sobre o assunto, tornando-se conscientes dos desafios e simultaneamente curiosas para experimentar. Assim, o aumento significativo de conteúdo sobre inteligência artificial como parceira contribui para a difusão da Empatia Programada.
Enquanto no imaginário coletivo os exemplos não param de chegar, no dia a dia real do brasileiro as companhias artificiais até aparecem, mas ainda não com esse afeto todo. Isso significada que na etapa de Apropriação da tendência ainda estamos no nível embrionário: os sinais são visíveis, mas temos poucas variáveis pulsantes.
Um dado interessante que ilustra esse cenário é o de que 64% dos bots criados por empresas no Brasil têm como finalidade Atendimento ao Cliente. Ou seja, a maior parte da nossa interação com eles ainda tem uma finalidade pragmática.
Mas, como dissemos, sinais fracos não podem ser ignorados e, se analisados de perto, nos dão ótimas pistas do que vem pela frente. Um exemplo é a análise dos dados de acesso do Charater.ai, aquele site que falamos lá no início, que tem o bot do terapeuta. Com 213 milhões de visitas no último mês, o Brasil ocupa a 3ª posição dos países que mais acessam. Ainda que seja um percentual pequeno, nos mostra que tem gente por aqui que sim, está levando esse relacionamento com I.A. mais a sério.
https://www.similarweb.com/website/character.ai/#social-media
Falando sobre relacionamento sério, outra variável que nos ajuda a enxergar essa evolução é a c.4 Conversa Popular, que hoje está no nível 2. Basta uma busca rápida no X [a gente aqui é millennial e não superou o nome novo] para ver que essa relação com a máquina já não é puramente servil e que tem muita gente querendo encantar o seu ChatGPT…
Já a Alexa, coitada, não tá com a mesma moral. O assunto principal em relação à ela são as brigas…
Link 1 Link 2 Link 3
Brincadeiras à parte, o fato é que os brasileiros estão cada vez mais personificando a inteligência artificial e, com isso, esperando que as interações mediadas por tecnologia sigam esse mesmo padrão.
Com alguns sinais pulsantes, muitos emergentes e vários embrionários, a tendência "Empatia Programada" se encontra no nível 2 do Trop Score, indicando que é um comportamento que está começando a se manifestar de maneira mais evidente [vide o cachorro do Alok], mas que ainda não atingiu uma maturidade plena, especialmente no contexto Brasil.
Ainda assim, esse estágio de tendência é muito oportuno para marcas, pois não é nem tão novo a ponto de não gerar engajamento mercadológico, e nem tão mainstream a ponto de não trazer inovação.
Em termos de timing, a tendência com TropScore 2 recomenda ações em um universo de até 2 anos, quando então a tendência passa a se popularizar de forma mais massiva.
Por que a trend Empatia Programada é estratégica para as marcas no Brasil?
A "Empatia Programada" reforça o crescente desejo e a expectativa por interações mediadas que sejam cada vez mais reais, afetivas e próximas. Em um contexto marcado por uma epidemia de solidão, as pessoas anseiam por um acolhimento nas suas interações digitais, seja com marcas, bots ou atendentes virtuais, coisa que antes encontrávamos uns nos outros.
Sendo o Brasil um país super adepto à novas tecnologias e ao consumo digital, à medida que a inteligência artificial impulsiona as ferramentas conversacionais aprimoradas, ela estimula o consumidor local a buscar/aceitar/exigir mais interações acolhedoras nas diversas plataformas. O atendimento do futuro não bastará ser ágil e eficiente, precisará ser cordial e cada vez mais empático.
Como colocar a tendência na prática?
A “Empatia Programada” inaugura um novo step na forma como nos relacionamos com a tecnologia, mas também entre a gente. A partir do momento que a Alexa sabe direitinho como eu gosto que ela fale comigo, o mínimo que eu espero do gerente do banco é que ele seja tão bom quanto. E isso coloca um novo desafio para marcas e, principalmente, para as pessoas que fazem as marcas. Afinal, queremos humanos que ajam conforme máquinas treinadas para serem perfeitas emocionalmente. Complexo, né? Por aqui, mapeamos algumas hipóteses de desdobramentos:
COMUNICAÇÃO:
A Empatia Programada indica uma necessidade da comunicação elevar sua capacidade de interpretar emoções e responder de forma adequada, transformando campanhas de marketing em experiências interativas que se adaptam em tempo real ao estado emocional do consumidor. Isso pode ser feito de um jeito complexo e super personalizado, como o projeto da Amazon que patenteou uma tecnologia que permite que seus dispositivos, como o Echo, analisem o tom de voz para detectar emoções como felicidade, tristeza ou raiva. E essa tecnologia poderia potencialmente ser usada para oferecer respostas mais sensíveis e personalizadas ou recomendações de produtos baseadas no estado emocional do usuário.
Ou de um jeito mais simples, que muitas vezes são apenas detalhes que trazem um certo acolhimento para a conversa, como quando o ChatGPT começa a conversa assim:
PRODUTO:
Tirando os assistentes virtuais, talvez o mais óbvio dos caminhos é o enorme mercado de companhia digital que se abre por aí. De terapeutas a simuladores de parceiros amorosos, as empresas que estão trazendo soluções usando I.A. para acompanhar os humanos em sua vida cotidiana não param de surgir.
Um exemplo é a a Soul Machines que criou a "Digital Marilyn," um chatbot de Marilyn Monroe, usando I.A. para imitar a aparência e voz da atriz. A plataforma garante conversar de forma emocional por até 20 minutos. A empresa também oferece chatbots de outras celebridades, acessíveis via assinatura.
Apesar de outros muitos exemplos nessa linha, queríamos destacar um outro caminho para produto que é a ideia de que a Empatia Programada nos estimula a pensar que toda interface e todo produto pode ser passível de empatia e cordialidade. E um exemplo interessante é o Kvitter, um simpático carregador de carro elétrico. Sim, isso mesmo.
O Kvitter EV é um protótipo de uma estação de carregamento de veículos elétricos idealizada como um equipamento interativo e emotivo. Com um rosto querido, o equipamento fornece informações sobre o carregamento, mas principalmente interage com o usuário para tornar a experiência mais próxima.
E aí o desafio é: se até um carregador de carro pode ser simpático, como o cliente vai aceitar um telemarketing grosseiro? [e aqui tem mil camadas né? afinal, o carregador simpático desliga. O atendente grosseiro muitas vezes é mal pago e sofre uma pressão absurda em um sistema precarizado. Mas isso fica pra outro momento…]
MODELO DE NEGÓCIO:
A "Empatia Programada" abre um leque de possibilidades para diversos modelos de negócio, desde B2C com inovações como o cachorro-robô Aulok, até B2B, onde empresas desenvolvem bots empáticos para outras organizações, e até mesmo modelos SaaS que oferecem terapeutas artificiais através de aplicativos. No entanto, a tendência vai além de modelos comerciais; ela redefine o como os negócios devem interagir com seus consumidores — seja através de um serviço, um produto ou um método de atendimento.
Essa evolução nos negócios não apenas amplia oportunidades, mas também intensifica a necessidade de um debate profundo sobre responsabilidade corporativa. Ao começarmos a proporcionar conforto emocional através de máquinas, surgem perguntas críticas: quem é responsável quando surgem consequências emocionais adversas, como corações partidos ou reações ainda mais sérias?
Além disso, se o desejo por acolhimento e pertencimento está no cerne dessa tendência, então, além do aspecto tecnológico, estamos discutindo questões fundamentalmente humanas. Isso coloca em destaque o valor das comunidades. Marcas que conseguem fomentar essa interação poderão abordar a tendência sem sequer mencionar um chatbot. Trata-se de utilizar a tecnologia para fortalecer conexões, como faz o Strava ao unir corredores que se motivam mutuamente, ou o Spotify, que me coloca no centro da experiência musical ao mesmo tempo que me permite seguir e interagir com amigos.
Pra fechar, a gente deixa uma reflexão…
Como a gente sempre fala por aqui, o futuro é resultado do que a gente já está construindo.
Casar com um holograma parecia impossível anos atrás. Hoje, isso ainda é estranho, mas já possível. Talvez amanhã todo mundo tenha um holograma para chamar de amor. O fato é que os sinais estão aqui. E se a sociedade está se acostumando com relacionamentos afetivos com/e mediados por tecnologias, teremos impactos na forma como a gente se relaciona não apenas com máquinas mas também entre a gente.
Não se trata portanto de aceitar ou não, criar um bot ou não, mas se preparar para um consumidor que vai aprendendo e exigindo cada vez mais uma atenção personalizada e autocentrada. E nesse contexto, a pergunta que fica é:
Como sua marca pode permanecer autêntica e humana em uma era onde a inteligência artificial pode simular a profundidade emocional e a compreensão?
Por hoje é só pessoal.
Saudações humanas pra vocês :)
A Empatia Programada é uma das 5 tendências do Modo PROMPT, novo estudo de Trop que investiga como a Inteligência Artificial está impactando a forma como vivemos e nos relacionamos. O estudo está disponível aqui.
TROP - sinais de um futuro tropical, latino e circular